A divulgação da "comunidade monástica comunhão e misericórdia", e toda a história real de santa Faustina e Jesus misericordioso.
"O exorcismo não é mágica. Ele é um processo
de conversão, de mudança de vida. É um tratamento que pode durar um mês ou
muitos anos", explica padre Geovane Ferreira, 35, o único religioso do
Estado do Rio de Janeiro autorizado pelo arcebispo Dom Orani João Tempesta a
praticar o exorcismo.
Há onze anos, o padre comanda a Paróquia Sagrada
Família, na favela Nova Holanda, no Complexo da Maré, zona norte da capital
fluminense. Segundo ele, existem duas formas de se fazer o exorcismo: uma em
menor escala, na qual é possível alcançar a cura com orações de libertação, e
outra maior, em que é necessário um ritual.
A primeira ocorre para casos de opressão, quando
"aquela voz [interior] fica te levando a pensar e agir mal", e de
obsessão, no qual as pessoas são obsessas "por dinheiro ou por
prazer". Já o exorcismo maior é feito por conta de possessão do demônio.
"O demônio toma todo o corpo da pessoa. Ela muda de voz, fala línguas que
nunca estudou e começa a saber coisas ocultas. Uma das técnicas que a gente
faz, quando quer saber se a pessoa está possuída, é esconder alguma coisa
dentro do bolso e perguntar ao demônio o que é", explicou o padre.
"Se ela realmente tiver o demônio, ela vai dizer. Se for só a pessoa, ela
nunca vai saber."
Antes de o exorcista atender o paciente, o religioso explica que há uma análise
do caso, por parte de membros da igreja e de uma equipe formada por
psiquiatras, psicólogos e neurocirurgiões. Após a comprovação da possessão do
demônio, o padre está autorizado a fazer o ritual.
"A sessão é feita em lugares reservados, por
um exorcista, com a ajuda de pelo menos um psicólogo e um neurocirurgião ou
profissional médico para analisar o que está acontecendo. O corpo pode passar
mal, ter algum distúrbio de pressão alta, de desmaio. Às vezes é necessário que
alguém segure a pessoa para que ela não se machuque", disse. "Há
casos em que a pessoa começa a bater a cabeça na parede, no chão."
Durante o ritual, que não tem tempo estimado de duração, o padre se veste com
uma estola e usa crucifixo, água benta, óleo e sal exorcizados. É necessário
que o paciente aceite participar. "A família pode até trazer, mas para ter
a libertação, é necessário que a pessoa queira", diz o padre.
"Toda possessão [pelo demônio] tem que ter o
querer da pessoa. Em algum momento, ela tem que dizer: "Eu quero".
Deus nos fez livres", explica o religioso. "O demônio só pode nos
tomar essa liberdade se a gente deixa. Pode ser por um pecado, por um desejo
pessoal, por um pacto com o demônio. Muitas pessoas pedem que o demônio dê
dinheiro."
Nos anos 60, houve uma atualização do manual com o
que havia de novo na ciência, segundo padre Geovane, que trabalha com exorcismo
desde 2005. Há dois anos, ele estudou o tema em um curso de duas semanas que
fez em uma universidade católica, em Roma.
"Comecei acompanhando padre Nelson [Rabelo,
92, antigo exorcista do Rio de Janeiro], em 2005. Rezava, ficava ao lado só
para estar junto. Quando ele ficou doente, há quatro anos, eu comecei a atender
oficiosamente", explicou o padre Geovane. "O bispo viu que era um dom
de Deus e me chamou para ser exorcista. Fui para Roma fazer o curso e voltei
pertencendo ao Conselho Internacional dos Exorcistas e exercendo o exorcismo
oficialmente."
Na Itália, o religoso participou de um ritual de
exorcismo como ajudante. No Rio de Janeiro, o religioso conta que não tratou de
nenhum paciente. Ainda. Ele espera, para as próximas semanas, o laudo final da
equipe de psicólogos, psiquiatras e neurocirurgiões que vai dizer se um homem
que frequenta a paróquia tem esquizofrenia ou possessão pelo demônio. Os
profissionais que trabalham com o padre não são fixos. Eles são conhecidos que
o ajudam quando chega um caso. "Um deles não é nem católico", afirma.
Em São Paulo, padre Geovane foi chamado há alguns
anos para tratar de um homem. "Atendi, durante um mês, um caso em São José
do Rio Preto [SP]. O rapaz era satanista e comia vísceras de bebês mortos. Não
sei onde e nem como ele comprava, mas ele fez um pacto com o diabo, comeu
vísceras, fez oferenda de vários animais e disse que queria pertencer ao
demônio", lembra o padre. "Ele tinha uma força muito grande, 20
homens não conseguiam contê-lo. Ele conseguia falar alemão, francês e italiano,
sem nunca ter aprendido. Não falava português direito. Ele sabia de coisas
escondidas, de pecados de várias pessoas que estavam presentes e que ninguém
sabia. Hoje ele dá testemunho e está totalmente liberto."
Conselho
Nacional dos Exorcistas
Nas últimas semanas, além dos trabalhos na comunidade
da Maré, ele também está envolvido com a preparação da Jornada Mundial da Juventude. Cerca de 68
pessoas que trabalham como voluntárias durante o evento, provenientes de vários
Estados do Brasil, estão hospedadas na paróquia.
Assim que a Jornada acabar, Padre Geovane conta que
continuará a fazer um trabalho que parou por conta do evento. Junto a mais
quatro padres do Brasil, ele está procurando outros exorcistas em cada diocese
do país. Segundo ele, há mais de 300 dioceses no Brasil, e a dificuldade de se
contactar com elas é imensa, pois muitas não têm sequer telefone. O
objetivo do grupo é achar todos os padres que praticam o exorcismo no país,
reuni-los e formar um Conselho Nacional dos Exorcistas.
"Na Itália, existe um programa de televisão, no qual o exorcista fala
sobre o assunto e explica como funciona. No Brasil, falar de exorcismo é um
tabu. Tudo aquilo que você não conhece direito se torna nebuloso",
explicou. "Durante muito tempo, se pensou na não existência do demônio,
não na existência do mal. A sociedade da América Latina quis responder a muitos
problemas apenas com a psiquiatria e a psicologia. O demônio ficou muito mal
pensado."
Rio: briga
entre bem e mal
Durante os últimos 11 anos trabalhando dentro do
Complexo da Maré e às margens da Linha Vermelha, uma das vias expressas mais
importantes para quem chega à capital fluminense, o padre conta que nunca teve
problemas com o tráfico de drogas do local. "Eles nos respeitam muito,
nunca fizeram nada contra a gente."
Formado por 15 comunidades com 130 mil moradores, o
Complexo da Maré é dominado por duas facções de traficantes de drogas e uma
milícia. Cortado pelas três principais vias expressas do Rio (avenida Brasil e
Linhas Vermelha e Amarela), o conjunto de favelas é rota obrigatória para quem
chega ao Rio pelo Aeroporto Internacional Tom Jobim, na Ilha do Governador, e
precisa se deslocar para o centro, a zona sul ou à Barra da Tijuca, na zona
oeste.
No dia 25 de junho, após a operação do Bope, membros de ONGs que atuam na Maré
revelaram que há menos de um mês a PM realizou uma reunião com representantes
de todas as associações de moradores do complexo. O encontro foi em uma
universidade particular, no Centro do Rio. Na ocasião, foi dito que a Maré começará a ser ocupada pelas forças de segurança em
agosto, logo depois da Jornada Mundial da Juventude.
"Eu exorcizaria tudo o que está de errado na cidade do Rio de Janeiro.
Essa briga entre o bem e o mal é muito grande. Em determinados momentos, o mal
consegue um espaço para fazer o que ele quer", afirma. " Foi muito
bonito o povo sair para reivindicar, mas é muito triste ver que nosso povo
perdeu a noção do que estava fazendo e começou a quebrar tudo", diz o
religioso sobre as recentes manifestações na cidade.
Em maio deste ano, o canal "TV2000", da
CEI (Conferência Episcopal Italiana), divulgou que o papa Francisco havia
realizado "uma prece de libertação do demônio ou um autêntico
exorcismo" em uma criança doente que assistiu à missa de Pentecostes na
Praça de São Pedro do Vaticano.
Dias depois, o Vaticano declarou que o papa
Francisco não havia realizado qualquer exorcismo: "simplesmente rezou por
uma pessoa doente que foi apresentada a ele". "Ali não houve
exorcismo, apenas uma benção. O ritual é feito de maneira reservada e não em
público", afirmou padre Geovane ao ser questionado sobre o assunto.